SODAMNED: Brutalidade aliada à melodia.



Por Écio Souza Diniz

Fazer um Death metal que tenha diferencial é uma tarefa um tanto árdua, ainda mais hoje em dia. No entanto, temos sorte que há pessoas que desejam propor algo um pouco incomum, e essa característica o Brasil tem de sobra, o que nos dá motivo de orgulho de nossa cena, que tem bandas de ótima qualidade. Oriunda de Santa Catarina, a SODAMNED, nos mostra um Death metal brutal, técnico e coeso, com elementos diferenciais do convencional, e é para falar exatamente sobre isso que nós os chamamos o guitarrista/vocalista Juliano e o baterista Gilson para bater um papo e falar sobre a banda, sua proposta e trajetória.

Pólvora Zine: Primeiramente, como surgiu a SODAMNED?

Juliano: Foi em 1999, conheci o Gilson em 97 e montamos o Sodamned em 1999. A gente era bem inexperiente, ninguém nunca tinha tido banda, mas mesmo assim não começamos tocando cover, eu já levei pro Gilson duas músicas que eu havia composto e começamos a trabalhar nelas desde o primeiro ensaio. Um ano depois subimos em um festival de três dias, só com bandas de Death e Black Metal que havia aqui no estado naquela época.

Gilson: Já havíamos experimentado tocar juntos um ano antes, num projeto mais voltado ao Thrash/Death, mas não deu certo, inclusive esse projeto nem chegou a ter nome. No início do ano seguinte o Juliano nos mostrou umas musicas novas que ele havia composto, aí o resto é uma história que já tem durado 12 anos.

P.Z: Qual a proposta da banda vocês desejam passar musicalmente?

Juliano: Brutalidade e melodia. Sempre curti bandas que misturassem elementos como peso e velocidade, mas com melodia, e é isso que eu tento fazer. Nós temos músicas mais cadenciadas também, e passeia por mais estilos dentro do Metal, mas o que nos caracteriza é a brutalidade aliada à melodia.

Gilson: Isso mesmo. Fora isso aí, não temos maiores planejamentos em relação ao som da banda, tudo acaba sendo muito natural em relação aos arranjos e tal. Simplesmente se soa bem a nossos ouvidos a música é aprovada por todos.

P.Z: Vocês lançaram recentemente o debut álbum “The Loneliest Loneliness”, pela Face the Abyss e Metal Army. Este é um trabalho que achei excepcional em termos gerais de Death metal. Como se deu a concepção do álbum? E os processos de produção?

Juliano: Cara, eu acho que nem dá pra falar de um processo de composição deste álbum, pois tem música aí que foi composta há mais de sete ou oito anos, e só agora a gente acabou lançando. Quando a gente gravou a nossa primeira demo em 2003, nós já tinhamos material suficiente pra gravar um álbum, mas como era uma demo, escolhemos quatro músicas. Depois foi a vez do EP, no qual constam mais quatro músicas, e mesmo assim ainda tinha material sobrando, a composição se deu ao longo desses 12 anos de banda mesmo.

Gilson: Só corrigindo uma coisa: o lançamento é independente mesmo. A Face the Abyss está distribuindo as copias apenas, e iríamos trabalhar com a Metal Army, por isso do logo ali no CD, mas isso não foi adiante. Quanto à concepção do CD, chegamos num ponto que ou lançávamos um CD ou acabávamos com a banda, pois já haviam passado 10 anos desde o início de nossas atividades. Sem contar que nunca desejamos ter esse status de banda pequena, cult, desconhecida, pelo contrário queremos nos divulgar bastante, só que infelizmente sempre tinha alguma coisa atrapalhando. A produção do CD foi bem trabalhosa: a bateria foi gravada em Joinville no Vortex Studio e o restante no Nitro Sound do Rio Grande do Sul, tudo isso pelo produtor Roger Fingle que além de ter sido o engenheiro de som, ajudou em todas as fases de gravação, timbragem etc. Tivemos que viajar algumas vezes pra gravar e depois no processo de mixagem e masterização o Roger mandava amostras do som pela internet, até que chegou no ponto que está no CD.

P.Z: As duas características que mais se destacam para mim no trabalho da SODAMNED são: primeiramente o Death metal com uma técnica apurada que é contraposta ao mesmo tempo por uma face rústica, que é bem vista nos vocais bem crus, que ficaram muito bem aliados ao restante do instrumental. Segundo, o contexto do trabalho, que fala sobre o desespero de uma pessoa que tenta achar um caminho próprio, diante de muitas desilusões que sofre com as morais religiosas. Ou seja, há todo um conceito em cima de uma filosofia Nietzschiana. Tanto que até a arte gráfica é em cima da definição do eterno retorno das coisas, que Nietzsche pregava em suas obras. De quem partiu a ideia de usar essa roupagem nas letras? A intenção foi compor um álbum conceitual?

Gilson: Não, nunca intencionamos fazer uma obra conceitual. Na verdade me interesso mais em escrever nessa linha mais emocional, filosófica, assuntos mais individuais mesmo. Isso acaba conectando uma letra à outra, além da estética também, pois todas elas seguem uma linha mais metafórica. Claro, Nietzsche tem me influenciado muito e isso acaba refletindo nas letras, algumas mais explicitamente que outras. O resto do pessoal da banda gosta disso também, e o Juliano desde o início da banda me deu uma força nesse sentido, pois ambos gostamos desse tipo de tema. E, bem notado, a capa do CD e o título são frutos dessa experiência nietzschiana também.

P.Z: Além das características que citei anteriormente, outros pontos de destaque são, por exemplo, a inserção de backing vocals mais limpos em algumas partes alternados com os guturais e gritados, isto deu um ar diferenciado às músicas. O que vocês acham desses elementos no som de vocês?

Juliano: Então, o lance de mesclar vocais guturais e gritados é algo que vem desde o começo da banda, a gente sempre achou bacana isso. Eu sempre ouvi bastante MOONSPELL, MY DYING BRIDE, ROTTING CHRIST, e sempre achei bacana trabalhar em cima de mais tipos de vozes, apenas como elemento para agregar algo a mais nas músicas, mas como não sou o cara mais indicado para isso, a coisa tinha ficado só na ideia mesmo. Quando começamos a planejar a gravação do “The Loneliest Loneliness” eu já pensei em chamar o Éder do A SORROWFUL DREAM pra trabalhar em umas músicas com a gente, pois o cara é extremamente competente e trabalha sua voz de várias maneiras. Resumindo, não é algo que predomina, mas é um bom diferencial que soma muito às músicas.

P.Z: Como tem sido a recepção do público por aqui à “The Loneliest Loneliness”?

Juliano: Sei que é meio clichê dizer isso, mas tá acima do esperado, realmente algo que a gente não esperava. Nós recebemos este CD da fábrica apenas uns seis dias antes de embarcar pra Europa, e desde que chegamos de lá, ainda não fizemos nenhum show. Mas estamos trabalhando duro na divulgação desse material. Muita gente já ouviu e tem elogiado bastante esse trabalho. Os primeiros shows que temos marcados para 2012 são em Abril, aí em Minas Gerais, e não vejo a hora de ver a resposta do público ao vivo para as músicas desse álbum.

Gilson: É, depois de tantos anos de underground você acaba esperando pouco retorno do público e crítica, ainda mais que nosso som sempre foi um tanto incompreendido. Mas sinto que com esse CD as coisas parecem ter mudado e bastante!

P.Z: O que vocês acham do cenário metálico aí em Santa Catarina?  Europa, tocando em países como Bulgária, Croácia, Romênia, entre outros. Como foi esta turnê e a recepção dos europeus à SODAMNED?

Juliano: A recepção do público europeu ao nosso trabalho foi excelente, de forma geral. A maior parte dos shows que tocamos lá foram marcados com bem pouca antecedência, basicamente menos de um mês antes dos shows, então tivemos shows com bem pouco público, e outros, marcados há mais tempo, já tinham um público um pouco maior. O fato é que por onde passamos, fomos bastante elogiados, questionados sobre a cena Metal no Brasil, e fomos impressionantemente bem tratados.

Gilson: Sobre a cena aqui em Santa Catarina, digamos que está em declínio. Ainda possuímos um grande número de excelentes bandas, mas o público não tem dado o suporte necessário. Até poucos anos atrás tínhamos uma dúzia de ótimos festivais open air por aqui. Mas o público foi minguando nesses eventos, e por consequência os promotores desanimaram, inclusive eventos pequenos estão acontecendo com bem menos frequência. Temos agora somente um grande festival que é o Zoombie Ritual que tem atraído gente de fora e deve com certeza se tornar um dos maiores do Brasil, se já não é.

P.Z: Quais são as principais influências de vocês e os álbuns que mais marcaram suas vidas no Metal?

Juliano: Me sinto influenciado por absolutamente tudo que ouço, que vai desde OF THE WAND AND THE MOON até BEHEMOTH e IMMORTAL. Vou citar cinco albuns que de fato me marcaram: o “The End Complete” do OBITUARY e o “Screams of Anguis” do BRUTALITY, os dois primeiros albuns de Death Metal que eu ouvi e que me fizeram pensar pela primeira vez em ter uma banda. “Tales from the Thousand Lake” do AMORPHIS e o “The Angel and the Dark River” do MY DYING BRIDE, os primeiros albuns de Doom que eu ouvi e que me tornaram fã do estilo. Por último, mas não menos importante, “Non Servian” do ROTTING CHRIST, virei fã da banda assim que ouvi aquilo, era meio que aquela coisa que você quer ouvir, mas não sabe direito onde encontrar. Quase ia esquecendo o fantástico “Oimai Algaion” dos suecos do ALGAION. Foram estes álbuns que me fizeram compor as primeiras músicas para a SODAMNED.

Gilson: Posso dizer que em comum em todos nós no SODAMNED é que ouvimos realmente de tudo, principalmente falando em Metal. Discordamos entre um estilo e outro ou entre uma banda e outra, mas somos todos bem ecléticos. Além de Metal extremo eu ouço muito Metal tradicional, Thrash e até algo de Hard Rock. Só não sou muito chegado em Funeral Doom e Metal melódico, de resto em todos os outros estilos existe pelo menos uma banda que curto bastante. Quanto a bandas que me influenciaram a tocar, sou o tipo de cara bem comum: METALLICA, SEPULTURA e BLACK SABBATH que me botaram nesse caminho, e seus bateristas me fizeram ter interesse pelo instrumento que toco.

P.Z: Aqui no Brasil, vocês têm feito muitos shows também? Como está a agenda?

Juliano: Como a gente passou um bom período concentrado no lançamento do CD e na preparação da tour europeia, nós ficamos sem tempo de trabalhar em shows por aqui, mas agora estamos cuidando disso. Por hora a gente tem quatro shows marcados aí em Minas Gerais para Abril, e estamos acumulando contatos e planejando uma mini tour no Norte/Nordeste do país, que possui uma cena foda demais para Metal extremo.
Gilson: Além de estarmos estabelecendo contatos para alguns shows em outros países da América do Sul.

P.Z: O que vocês julgam como o mais complicado para se sobreviver no underground? E o que vocês acham positivo neste tipo de cenário?

Juliano: Acho que o mais complicado no underground é o amadorismo com que as coisas são tratadas muitas vezes. Tem gente que confunde ‘ser underground’ com ‘ser tosco’, o que acaba tornando difícil até de conseguir apoio por partes de órgãos ou empresas, como patrocínio para um evento ou endorsement para um instrumentista. Pra mim a coisa mais fantástica do underground é que você não tem barreiras entre o artista e o público, você vai lá, bebe sua cerveja com a galera, sobe no palco, toca e volta pro meio da galera pra festar com todo mundo o resto da noite, isso é algo realmente legal e que é difícil de acontecer num círculo mais mainstream.

Gilson: O mais complicado acaba aparecendo com o tempo: você acaba ficando mais velho e tem que conciliar o resto de sua vida, suas responsabilidades, com o fato de ter uma banda e ser uma pessoa ativa no underground. Quando você é novo tudo isso é fácil e divertido, por isso que com o tempo muitas pessoas acabam “sumindo”: o tempo vai pesando sobre você e você tem que gostar realmente desta vida pra continuar.

P.Z: Vocês farão shows com a banda DIVA SATÂNICA. Como está sendo essa parceria?

Juliano: A agência que cuida do agendamento de shows pra eles entrou em contato conosco, propondo uma parceria entre SODAMNED e DIVA SATÂNICA para o agendamento de alguns shows. Isso aconteceu bem quando eu estava acertando as quatro datas aí em Minas Gerais, então conversei com o produtor, que na mesma hora aceitou incluir a DIVA SATÂNICA no cast desses eventos, sendo que assim a agência da banda vai nos incluir em quatro eventos na Argentina.

P.Z: Como será essa programação para a Argetina. Falem-nos melhor sobre isso.

Juliano: Os shows acontecerão em outubro de 2012 e provavelmente acontecerão em três cidades diferentes: Buenos Aires, Rosário e Santa Fe, e também contará com a DIVA SATÂNICA no cast.

P.Z: Dentre as ótimas músicas que compõe “The Loneliest Loneliness” como ‘Tortures and Nightmares’ e ‘Ewige Wiederkunft’, a que mais se destaca para mim é ‘Fear’, com seu peso e técnica bem harmonizados. Qual é a música que vocês acham que melhor reflete a imagem da banda?

Juliano: Pra mim a ‘Tortures...’ é uma música que reflete bem o que eu sempre quis alcançar com a banda: peso, velocidade e melodia. Eu gosto muito dela.

Gilson: Essas músicas que você falou e talvez também a “The Mountain” condensam bem o que queremos passar.

P.Z: Além da divulgação de “The loneliest loneliness”, quais são os planos para este novo ano?

Juliano: Por hora a gente tá trabalhando bem pesado mesmo na divulgação do CD e no agendamento do maior número de shows possível. Nós temos plano pra produzir um vídeo para alguma das músicas do CD, e para gravar três ou quatro músicas para lançar um EP em 2013, mas por hora são apenas planos, pois nós temos realmente muito trabalho pela frente para o ano de 2012.

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