ROÇA ‘N’ ROLL – 19ª edição (2017): quase duas décadas de “mueção”!

Por Écio Souza Diniz e Ramon Teixeira.  Colaborou: Anderson Sabazinho

Marcando mais uma vez o feriadão de headbangers e entusiastas de música pesada de várias partes de Minas e de outros estados, o Roça ‘n’ Roll chega a sua 19ª edição dando um drible na crise econômica do país e oferecendo ao seus  participantes uma verdadeira maratona sonora regada a rock e metal em sua ampla diversidade musical. Considerado o maior festival de rock de Minas Gerais e um dos mais importantes do cenário nacional, nesta edição o festival contou com um cast intenso e, sobretudo, celebrativo da história do underground mineiro e nacional, proporcionando muita emoção a muitos presentes. Com um line-up que passeou por várias gerações do Rock/Metal nacional (de medalhões com mais de 30 anos de carreira a bandas iniciantes), o Roça mais uma vez fez bonito e “desceu a lage”.
Conhecer e reencontrar amigos, a grande tônica de um festival com um histórico longo de realizações. E esse ano não foi diferente. Para chegar ao festival, o PÓLVORA ZINE embarcou no ônibus disponibilizado pela organização do evento – uma iniciativa que faz parte da campanha “Se for beber, vá de busão” levada a cabo pela organização do festival desde de 2006 – e, logo ao chegar ao centro da cidade, enquanto se esperava o veículo próximo à Nave do ET, já era possível perceber a movimentação dos “camisa preta” infestando toda a cidade, marca registrada da paisagem mística da cidade de Varginha, nessa época do ano. Ao chegar à Fazenda Estrela, o clima de amizade e o entusiasmo pelo que há de vir aumentam consideravelmente, com todos à espera pra detonar tudo (no bom sentido).  
SURRA

Escalada para iniciar o “baile”, a banda varginhense de Death metal INCURSE sobe ao palco às 15:30 e inicia a pancadaria. Ainda que com um público reduzido, a banda não se intimidou e fez valer a oportunidade. Destacaram-se em sua breve apresentação as músicas Chaos by Madness e a faixa título do excelente EP lançado pela banda Hatred Nation (2017). Logo em seguida era a vez da banda SURRA, pela primeira vez no festival, executar seu thrascore politizado. Com claro posicionamento político, a banda fez questão de deixar seu recado através de suas letras cantadas em português e nas falas de seu vocalista Léo Mesquita que mandou seu recado “Fora Temer” e contra todo tipo de opressão. Divulgando o conceituado Tamu na Merda (2016), a banda fez o sangue dos presentes esquentar com músicas rápidas e nervosas como MerendaEmbalado pra Vender, CubathrashDaqui pra Pior7 X 1  e Não Tem Boi.
LOBOTOMIA

Com o público aumentando e tomando o pasto do Roça e com muitos shows ainda por rolar, na Tenda Combate as atividades haviam também iniciado e a banda de Divinópolis CREMATÓRIO executava seu Black/Trash metal de forma empolgada. Executando as músicas da demo Incineração Bestial (2016) intercaladas com alguns covers, a desgraceira sonora foi garantia certa. Uma cena bonita de se ver foi o fim do show com os bangers, que se amontoavam em frente ao palco, cantando a plenos pulmões o refrão da música Headbangers de Satan. No palco principal, quem comandava o som era a LOBOTOMIA. Em sua primeira visita pelo Sul de Minas, chamou a atenção a performance epilética do vocalista Edu Vudoo que possui um vocal peculiar – ora parecia que se estava a escutar Max Cavalera cantar, ora o João Gordo, ora os dois! – e os riffs thash executados por Guilherme Gotto.  As músicas de seu novo álbum Desastre (2016) mostraram a que veio essa formação repaginada da lendária banda paulista de punk/crossover, que esse ano completa 31 anos de carreira.
 A importante banda do triângulo satânico mineiro SCOURGE foi que deu seguimento à ‘mueção’. Alguns problemas técnicos durante a apresentação não foram suficientes para ofuscar o ‘Hate metal’ executado pelo power trio uberabense comandado por Juarez Távora que mandou sua mensagem e mostrou que  a cena underground mineira oldschool está muito viva e com sangue nos olhos. Além de pedradas do mais recente álbum, Hate metal (2013), a avalanche sonora também foi capitaneada por petardos de … on the Sin, Death, Lust and Hate… (2010). Os riffs cortantes do guitarrista Pretho aguçavam o caos interno dos seguidores do bom Death metal da velha guarda.
SCOURGE

Para dar um breve intervalinho da quebradeira sonora e “encher o tanque” fomos às tendas do grupo Ordo Draconis Belli que vendiam roupas e acessórios medievais, faziam encenações de batalhas e tinham até jogos como tiro alvo com arco e flecha (Nota: por sorte o alvo era voltado para uma das paredes de contenção do evento. Risos). Os presentes se divertiam descontraidamente num clima bastante amistoso.
Na Tenda Combate, com o local abarrotado de gente, uma das melhores apresentações da noite neste local ficou a cargo da entrosada banda APPLE SIN. Dando vida ao seu full lenght Apple Sin (2017), a banda comandada pelo excelente vocalista Patric Belchior proporcionou aos presentes um show técnico, intenso e empolgante do início ao fim. Toda a animação da banda e público naquele disputado pequeno espaço da tenda animadamente cantando a faixa-título do disco, com seu refrão marcante, ficará na memória por muitos anos!
ANEUROSE

Já ao entardecer, ao deixar a Tenda Combate, era possível ver um grande público agitando ao som da banda ANEUROSE, oriunda de Lavras, cidade próxima à Varginha. Três anos após sua primeira apresentação no festival e em seu primeiro show em solo brasileiro após a turnê europeia de Juggernaut (2016), a banda fez bonito com sua sessão de pancadaria em forma de música. Num puta desempenho, o vocalista Wallace Almeida comandou um dos shows mais intensos da noite. Pedradas no naipe de Rapriest fizeram caboco garantir o torcicolo para mais tarde. Além disso, com doidos mosh pits com direito a um ‘wall of death’ próximo ao fim do show, o Thrash metal executado pela banda deixou o público ensandecido e fez história mais uma vez. Na Tenda Combate finalizava as apresentações da noite a banda UNTIL THE END de Itauna-MG. Músicas autorais como, HypocrisyMessage Conspiracy of Words e a finalização do show com cover de Arise (SEPULTURA), com destaque para a potência vocal de Bete Monteiro, agitou o público e selou muito bem as apresentações nesse espaço tão democrático do festival.
LOTHLÖRYEN

Já com um histórico bem construído no festival, o LOTHLÖRYEN entrou em cena com seu Folk Metal bem executado e já conhecido na Europe. Além disso, a banda celebrou seus quinze anos de atividade no palco do Roça, que nas palavras do guitarrista Leko Soares “é um palco onde nos sentimos em casa e isso nos deixa muito motivados”. O setlist do show percorreu músicas dos álbuns mais recentes como  When madness calls(Raving souls society, 2012) e Heretic chants (Principles of a past tomorrow, 2015), mas também clássicos da banda e do Metal sul-mineiro como My mind in MordorThere and Back Again e Hobbit’s Song.
Logo na sequência, um dos shows mais aguardados pelo público que já se espremia entre a grade de contenção. Estamos falando da banda PROJECT 46, que em sua segunda passagem por Varginha – agora com Baffo Neto (ex-CAPADÓCIA) no baixo e Betto Cardoso na bateria – colocou o festival abaixo com petardos de sua ascendente carreira. Caio MacBeserra (que não para um instante no palco!) mais uma vez surpreendeu os presentes confirmando os rumores de capitanear um dos moshs mais violentos do festival com direito a mais uma wall of death insano. Em uma apresentação memorável, se destacaram as músicas Atrás das Linhas Inimigas, Amanhã Negro, Erro + 55, Acorda pra Vida e o novo single Febre. Agora é ficar na expectativa pelo novo álbum que está a caminho. 
OVERDOSE

Pra dar um descanso aos bangers, os anfitriões do THUATHA DE DANANN – dessa vez sem o guitarrista e um dos fundadores da banda Rodrigo Berne, que recentemente anunciou sua saída – sobem ao palco acompanhados pelo Roadie e músico de apoio Julio Andrade na guitarra e juntamente com MARTIN WALKYER (Inglaterra) apresentam um belíssimo, animado e viajante Folk metal. Ainda houve a participação especial de Jaqueline Taylor (THE CLAN DESTINED) e Raphael Wagner (ANEUROSE). As clássicas do TUATHA como Believe It’s True e Tan Pinga Ra Tan foram cantadas em coro por todos os presentes. Também agitaram a galera músicas do mais recente álbum, Dawn of a new sun (2015), como The Brave and the Herd e Rhymes Against Humanity com Bruno Maia dividindo os vocais com MARTIN. Para incendiar mais ainda tocaram junto a MARTIN suas músicas dos tempos de SKYCLAD como Penny Dreadfull e Inequality Street, além de T.c. Lethbrighe de seu novo projeto THE CLAN DESTINED.
MIASTHENIA

Em seguida, a lenda mineira e nacional, OVERDOSE, não apenas presentou a todos com seu retorno como também proporcionou a muitos que não puderam assistir a banda nos anos 90, antes de cessarem suas atividades, um show calcado em autenticidade, feeling, peso, irreverência do vocalista Bozó e clássicos do Metal tupiniquin. Além disso, a galera nova que acompanha Bozó e seu irmão Claudio David (guitarra) mostrou que não estavam ali atoa. Era possível ver o êxtase nos rostos dos presentes ao escutar músicas como Anjos do apocalipseRio, Samba e Porrada no MorroManipulated ReallityZombie Factor e Favela. Para finalizar, a banda executou Última Estrela, hino do Heavy metal mineiro que fez muito marmanjo encher os olhos de lágrimas. Show histórico!
            Pela primeira vez no Sul de Minas, o MIASTHENIA fez um show memorável baseado em seu Extreme Pagan Metal cantado em português. Em turnê de divulgação do recém-lançado Antípodas (2017), a banda apresentou um show um pouco curto é verdade, mas certeiro. A banda estremeceu o palco executando as músicas XVIDimensão Totêmica AncestralEntronizados da Morte do excelente Legados do Inframundo (2014), 13 Ahau Kátun e Ossário, a única do novo disco. São impressionantes o vigor vocal de Hécate, a dinâmica do baterista Nygrom e técnica e pegada consistente de Thormianak. Sem dúvida, uma das melhores apresentações desta edição do evento.

ANDRE MATOS

De maneira inteligente e valorizando o metal nacional, a organização do festival substituiu à altura a banda portuguesa MOONSPELL, que, por motivos alheios à organização do Roça, não pode estar presente ao evento. Os presentes então puderam presenciar o espetáculo bem estruturado, técnico e repleto de feeling proporcionado por ANDRE MATOS, executando na íntegra o clássico Holy Land (1996). O guitarrista Hugo Mariuti (ex-SHAMAN) também foi um destaque e mais uma vez mostrou porque acompanha o vocalista já a mais de uma década. Certamente mais um show que ficará marcado na memória dos fãs, principalmente com canções como pesada Nothing to Say, as suaves e profundas Silence and DistanceMake Bilieve Deep Blue, a progressiva e apoteótica Carolina IV, além das raízes indígenas contidas na faixa-título do disco, Holy Land. No bis, os presentes ainda contaram com o clássico eterno Carry On, que segundo o próprio ANDRE é até hoje o maior sucesso de sua carreira.  Na edição desse ano, atestando a tradicional abertura do evento para todos os gêneros do rock, um show, que de início gerou maus rumores entre alguns bangers mais conservadores, garantiu a diversão de muita gente e ajudou a esquentar o frio que nessa altura da madrugada já começava a incomodar. Trata-se do show do cinquentão SUPLA, que, pela primeira vez tocou no festival. Com uma performance irreverente, ele agitou a  galera – com direito a descida na grade para cantar junto com o público. A música Garota de Berlin selou a participação do artista no evento.
SOULSPELL

Pela primeira vez no sul de Minas Gerais, o projeto brasileiro de Metal ópera SOULSPELL capitaneado pelo baterista Heleno Vale proporcionou um show bem interessante, envolvente e técnico para o público, inclusive promovendo oficialmente o lançamento do novo álbum The second big bang . A performance de todos os músicos participantes do projeto presentes foi empenhada e bem executada, e mesmo alguns problemas técnicos em alguns momentos não depreciaram o valor e mérito da apresentação. Dentre os vocalistas presentes, a performance de Jefferson Albert, Victor Emeka e Daísa Munhoz (VANDROYA) se destacou em vários momentos. Todavia, os vocalistas Pedro Campos, Talita Quitano e Edney Marques não ficaram atrás e também fizeram bonito. A entrada certeira com a potente The second big bangAdrift,Dungeons and dragons, Labyrinth of truths Father and son foram alguns dos momentos marcantes do show. Embora, o SOULSPELL tenha agregado participação de vários músicos de renome (ex: Arjen Lucassen, Timo Kotipelto, Roland Grapow, Tim “Ripper Owens”, Jon Oliva, Zak Stevens, Blaze Bayley etc), a presença apenas dos músicos brasileiros neste show confirmou mais uma vez a variedade de talentos que o Brasil possui e que não fica devendo largamente para projetos similares de maior renome (exemplo: AVANTASIA, AYREON etc).
SALÁRIO MÍNIMO

Antes de dar nossa debandada do evento rumo ao merecido descanso, paramos para prestigiar uma das clássicas bandas do Metal nacional, os paulistanos do SALÁRIO MÍNIMO, que como sempre deram seu gás em prol dos presentes independente da hora já avançada e um público menor.  A presença de palco sempre marcante do vocalista China Lee cantando clássicos como Anjos da EscuridãoCabeça Metal e Delírio Interestelar. Além disso, a banda estava acompanhada pelo guitarrista Roger Vilaplana (ex-CENTURIAS e NOSTRADAMUS), que fez uma excelente dupla com Júnior Muzilli. Ao final a banda agradeceu aos presentes por terem esperado o seu show. Por aí, entendemos que uma das coisas que torna uma banda grande é combinação da paixão pelo que faz e a humildade.
SUPLA


Infelizmente, as bandas VENEREAL SICKNESS e VÁLVERA cancelaram suas apresentações no festival, reduzindo o cast do evento. Pra compensar, tivemos a excelente notícia que esse ano não será o último ano do festival na Fazenda Estrela, isso porque a hidrelétrica que será construída próxima ao local, não afetará o tradicional local do fest. Ano que vem o festival acontecerá no mesmo local. E lá se vão 19 anos de saúde, vigor e rock na roça. Vida longa ao Roça ‘n’ Roll!